quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O que é a corrupção policial?

Um dos grandes desafios da democracia brasileira na atualidade diz respeito ao combate à corrupção que se encontra embrenhada no seio do Estado.
O alto nível de corrupção das instituições coloca em xeque o Estado democrático e de direito, além de fragilizar os arranjos organizacionais, indispensáveis para a estabilidade do sistema social e político. Por isso, podemos discordar de muitas das ações empreendidas para o enfrentamento da criminalidade, no Rio de Janeiro. Mas é imperioso concordar em pelo menos dois pontos: há uma ação coordenada e duradoura envolvendo os três níveis de governo, articulando ações de combate e prevenção ao crime. Segundo, parece que há uma decisão política dos governos, especialmente dos estaduais, na reestruturação do sistema de segurança pública, o que implica no enfrentamento de mazelas históricas, entre as quais a corrupção policial.
A corrupção policial consiste no uso do poder de polícia para a obtenção de ganhos de natureza extralegal. De um modo geral, entende-se como corrupção policial a ação de agências ou atores institucionais de polícia que não condizem com as práticas legalmente adotadas pela instituição. Deste modo, atitudes como a parceria com o crime (quando a atuação policial se dá de modo a facilitar a ocorrência de comportamentos delituosos), apropriação indevida do produto de apreensões de mercadorias, ganhos extraorganizacionais obtidos em troca de proteção, extorsões, aplicação diferenciada da lei sobre minorias sociais, cobrança ilegal por segurança (como ocorre com as milícias) são alguns exemplos dos modos como a corrupção policial se manifesta.
Como enfrentar o crime quando parte dos agentes responsáveis pelo seu combate não são confiáveis e, mais que isso, estão envolvidos com variados tipos de ilegalidades? Como tornar a polícia mais confiável, quando muitos agentes são comparados aos criminosos mais perigosos? As tentativas de depuração em curso nas agências policiais fluminenses demandarão empreitadas constantes do Estado, dado o nível de comprometimento dessas instituições. Porém, simbolicamente, o enfrentamento público do problema, por si só, sinaliza que o poder público está empenhado nas impostergáveis mudanças, fundamentais para uma “virada no jogo”. Vários exemplos internacionais mostram que o êxito no combate ao crime está atrelado ao combate à corrupção policial: Nova York, Bogotá e Medellín são alguns desses exemplos.
A corrupção policial no Rio é apontada por muitos como a mãe da maioria dos males da criminalidade local. Se as operações no Complexo do Alemão simbolizaram a retomada do território, o enfrentamento da corrupção policial será a reconquista do controle estatal do aparato de segurança pública, até agora minado justamente pelo alto grau de decomposição das instituições policiais fluminenses. A corrupção policial atinge o princípio da igualdade e da justiça, destrói a confiança dos cidadãos e deslegitima as instituições de segurança. Atinge diretamente o ideal da transparência pública e amedronta a cidadania, princípio básico da democracia. Por isso, a corrupção produz injustiça de todos os níveis, gerando uma quantidade imensa de custos sociais, sendo o principal, a escalada da violência e da criminalidade. Portanto, extirpar a corrupção nas polícias é a principal batalha na guerra contra o crime e, se o estado vencê-la, terá grandes condições de êxito em toda a empreitada que visa à melhoria objetiva da segurança pública. Se capitular, mais uma vez todos perderão. Registre-se, não obstante, a expectativa de que todas as ações de combate à corrupção policial transcorram dentro da legalidade e com transparência.
Robson Sávio Reis Souza
Pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG (Crisp), associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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